O louco, o maluco e o doido



Por John paul

Vocês são Doidos! essa era a reação de quem ouvia quando a gente contava que ia pra São Tomé por Lajes Pintadas e voltar Cerro Corá e sem carro de apoio. Como dizia Biô: Nosso carro de apoio é Deus.

2 horas e 43 minutos da manhã do dia 7 de Setembro de 2015. Eu, Pai e Biô iniciamos nossa ciclo viagem todos carregados com água, rapaduras, e até mel. ainda levei 3 bolinhos que estavam de bobeira lá em casa. A previsão para chegar em São Tomé será por volta das 8h da manha.

As condições de viajar de madrugada são perfeitas: não faz calor, vento fraco e pouquíssimos veículos passando. Dos veículos que passaram por nós, 3 me chamaram a atenção.

O primeiro a gente encontrou ainda perto de Currais. Parecia ser um Monza ou um Santana que vinha sentido contrário o nosso e estava com um farol queimado. O motorista quando nos viu começou a buzinar. Rapaz, eu não entendo buzinês, mas imaginei que o cara queria dizer "Bão pra onde bando de doido uma hora dessas?"

O segundo foi um caminhão baú que ia no mesmo sentido que o nosso. O motorista buziou bem longe para avisar e logo descemos pro acostamento. O danado ainda preocupado com nossa segurança a botou o caminhão na contra-mão para nos ultrapassar.

O Terceiro veio logo em seguida o caminhão, era um Ford Ka. O motorista fez a mesma coisa do motorista do baú, porém ele também ligou os alertas. e desligou lá na frente. Rapaz, se todo motorista fosse preocupado com a segurança do próximo na estrada era bão demais.

Já passavam das 6 da manhã quando chegamos na entrada para Lajes Pintadas. Já tínhamos pedalado 51km. Paramos para tomar água, comer rapadura e bananas. Tínhamos que dar um reforço, pois o muído ia ser grande a partir dali.

Estradão para Lajes Pintadas


Começou o Barro! Até Lajes pintadas tudo numa boa, só um sobe e desce de leve, nada de assustador. Passamos por Lajes Pintadas e começou o muído. Bastou só passar pelo açude que teve logo uma subida braba. Terminou de subir a primeira, apareceu mais outra. Uma descida e novamente outra subida braba.

Não me importei muito, estava encantado com a paisagem, eram casas to topo das serras, tava nem aí se a subida parecia mais uma parede.

Topete no sítio Boqueirão em Lajes Pintadas


Ia tudo bem, foi quando chegamos no Sítio Boqueirão. Vi  aplaca apontando São Tomé para a esquerda. Quando faço a conversão, tá lá, um topetão reto pra gente subir e todo em areira. Tava parecendo mais o Morro do Careca. Sacanagem né Google Heart, Você não me mostrou ia ter isso. 

E como diriam na quadrilha: E segue o passeio! Já perto do sítio Gameleira, Biô começa a sentir o joelho direito e tivemos que diminuir o ritmo. Passamos pelo Sítio Gameleira. Aquela região é bonita demais, fiquei muito encantado com toda aquela paisagem. E quando começamos a descer, foi que fiquei doido mesmo com aquele mirante.

Já se passavam das 8 da manhã. Depois de ter descido a serra da Gameleira e rodado um bucado na chapada encontramos 2 ciclistas e foram gritando "são os caras de Currais?". Pensei logo que eram os Tigres que vieram ao nosso encontro, mas não. Eram outros 02 malucos de Natal que estavam hospedados na casa de Emerson e estavam indo para umas trilhas, como diriam eles, com emoção. Já estavam sabendo que a gente vinha e esperavam nos encontrar no caminho. Eles ainda nos disseram que faltavam uns 5km até são Tomé.

Rodados mais um pouco e começamos a avistar uma torre. Pronto" só poderia ser São Tomé. Foi nesse exato momento que recebo a ligação de um Tigre, era Ponciano. Informei a localização e ele disse que nos aguardava no pórtico da cidade.

Bastou só pedalar mais um pouco e a gente já tava na pista. Não acreditava rapaz que a gente já tava concluindo a primeira etapa da viagem. Passava das 8 e 30 quando Chegamos no Pórtico da cidade e o Tigre Ponciano já nos aguardava. Olhei no velocímetro que marcava 81km.



Pela primeira vez estava entrando em São Tomé. Era feriado, mas a cidade estava bastante movimentada. E não entramos de qualquer jeito na cidade, éramos escoltados por um Tigre numa moto. Mais à frente outros Tigres começaram a sair de suas tocas e viram nos escoltar. Vitinho e Lalau chegaram junto de moto e nos acompanharam até toca de um outro Tigre de nome Lalá onde iria nos receber para um café da manhã.

Sabe aquele que diz que é melhor um Tigre em São Tomé do que dinheiro no bolso? Pois é, nos sentimos em casa. O Lalá e os demais Tigres foram muito receptivos conosco. O Café foi uma maravilha. Tinha dois tipos de bolo, café com leite, água de coco, cocadinhas, tapioca, mas o melhor de todos para mim foi um maravilhoso suco de abacaxi me acabei todinho nesse suco.


Enquanto a gente tomava café, outros Tigres que não lembro o nome começaram a aparecer. Apareceu a história que o tigre Emerson queria desafiar Pai na saída pra Cerro Corá. Os caras começaram a fazer a resenha da Burra Branca. A resenha foi se estendendo e eu fui logo tirando os tênis e me sentei no chão pra descansar.

Já perto de ir embora, chega Emerson já pronto para nos acompanhar até o final do asfalto e a galera começou a resenha começou com a história do duelo dele e de pai. Pois bem, já se passava das 10 horas quando arrumamos a troçada, enchemos as garrafas e fomos pegar o beco rumo a Cerro Corá, mas antes os Tigres da partida uma foto com os Tigres para ficar marcado na história essa resenha.



Nos despedimos dos Tigres e seguimos nossa rota, mas antes uma parada na farmácia onde Biô comprou um Gelol pra ver se melhora o joelho. Já eram quase 11 quando pegamos a tão famosa Estrada da Produção.

Não demorou muito e Emerson acunhou, o boizin realmente levou a serio a resenha do duelo. Olhei pra trás e Biô já estava ficando pra trás, o joelho não tava respondendo legal, então eu e pai diminuímos o ritmo e o Emerson nem bala pegava mais.

Seguimos pela estrada da produção que vai até Tenente Laurentino Cruz, mas só tem 10 km de asfalto até agora. Pedalamos uns km de asfalto e já encontramos a ponte sobre o rio Potengi, mas passamos do lado dela, pois só a estrutura está montada.



Depois dos 10km de asfalto encontramos novamente o barro. Mais a frente pegamos uma subida e logo vejo uma longa descida que não é muito inclinada, porém muito comprida. Lá na frente o Emerson já esperava a gente. Coloquei na banguela e deixei a gravidade tomar de conta.

Era tanta trepidação que percebi uma das garrafas caindo. Deu vontade de parar para pegar, mas me lembrei da queda que sofri por causa dessa garrada e deixei pra lá, afinal Pai e Biô vinham distantes e poderiam parar para pegar. Além do mais tinha outra garrada e mochila completinha.

Pois bem, nos despedimos do Emerson e seguimos a rota. Toda aquela beleza que a gente viu depois de Lajes Pintadas deu lugar a seca. Você olha para todos os lados, só se vê seca. nenhuma árvore para fazer sombra, poucas casas e mesmo assim distantes umas das outras. A estrada repleta de pedras soltas deixando ruim a viagem. Por causa do Joelho lascado de Biô, a gente pedala a 15km/h em terreno plano.

O calor só aumentava e o deserto só aumentava. Já passava das 13h quando depois de 18km pedalados chegamos no Povoado Ingar. Paramos numa bodéga e compramos água, pedi logo uma coca-cola para dar gás e comemos uma passa-tempo pra aumentar a glicose.

Enquanto a gente descansava aproveitava para conversar um pouco com o dono da bodega. O assunto principal era água, Queríamos saber como as outras regiões estavam se virando com essa seca.

O dono da bodega então perguntou a nossa rota. Quando ouviu sua reação foi aquela de praxe "esses omi são doidos". Foi então que ele começou a contar seus relatos que quando era novo sempre ia de bicicleta pros cantos e aqui acolá fazia uma doidice que nem agente, só que era com barra circular. Comecei a perceber que todo mundo tem alguma história sobre bicicleta pra contar.

Bucho e mochila e garrafas cheias, é hora de pegar o beco novamente. Perguntei quantos km faltavam para chegar em Cerro Corá, o caba lá nos disse que ainda faltavam 18km. Parecia pouco, mas contando que era barro, ainda tinha 1 serra pra subir, então era chão demais pra rodar.

Continuamos a viagem e Biô começou a reclamar do segundo joelho. Pronto! agora Torô dentro, Não podia aparecer uma subidinha que o omi descia da bike e ia empurrando, ele dizia que não aguentava fazer força no pedal, mas andando não sentia nada. Pra não deixar Biô sozinho eu ia empurrando com ele, enquanto isso pai, o melhor do mundo, subia as ladeiras.  Pra completar nossa água acabou logo. Olhamos para todos os lados e nada de casas para irmos em busca de água. Num tinha uma nuvem para fazer um sombrinha.



Já passavam das 13h quando avistamos uma serra pra subir. Eita, era o topete que tinha visto no google maps e que o pessoal falava. É só passar por esta serra e avistaremos Cerro Corá.

Começamos a subir serra. eu e Biô ia empurrando e pai, foi embora desembestado. quando mais a gente se aproximava do topo, mais eu me empolgava em começar a ver Cerro Corá.

Fiquei puto da vida. Nada de Cerro Corá. Começamos rodar mais e mais. Até que passou pela gente uma Strada com placas de Santa Cruz. O cara parou e reconheceu Biô. foi logo dizendo "bóra pra não subir essa serra.". Pensei que Biô ia subir na caminheta, mas não, despachou o caba e seguimos viagem. Biô disse que já tava na merda, então tinha que terminar.

Andamos mais um pouco e passamos pela entrada do açude do pinga. Começamos a descer um ladeirão. E como sabemos, para toda descida tem uma grande subida. Comecei a avistar outra estrutura de ponte e quando olho pra cima o verdadeiro topete para chegar em Cerro Corá.

Caraca, me assustei todo. Serra grande da bexiga era aquela. Começamos a descer a ladeira antes de subir a serra e avistamos uma casa lá embaixo à beira da estrada. era nossa esperança para tomar água. Quando chegamos lá, tudo fechado.  O jeito foi subir mesmo.

Trecho de aproximadamente 4km de subidas. Clique na foto para ampliar


Até que não foi tão ruim de subir essa serra, até porque não subimos pedalando hehehe. Sem contar que a gente tava morrendo de sede e num tinha uma casa pra pedir água. A única casa que tinha estava fechada. Ainda encontramos uma estação de água da Caern. mas estava toda nos cadeados acabando nossa esperança de molhar a guela.

Pense numa agonia. Continuamos a subia e após fazer a curva, tava lá o véi mau pai tirando onda, se aquecendo e gritando "o vein aqui maltrada". A pegada de ar foi grande. chegando no topo da serra, Biô arriou de vez e eu e pai somos atrás de água em uma casa ali perto.


Chegando na casa fomos recepcionados por uns 8 cachorros que começaram a nos estranhar, mas aos poucos foram se acalmando com nossa presença. Pedimos água ao senhorzinho que estava na porta. Ele bem simpático nos trouxe uma garrafa de 2 litros que suava de tão gelada que estava. Pense num alívio que tive. Voltamos pra onde Biô estava e ele já tava todo estirado no chão.  Depois de tomar água pegamos o beco novamente.

Término da subida da serra do Pinga. Biô ae já tava com o motor batido


Eram por volta das 3 e 30 da tarde quando chegamos na casa do sogro de Biô. Almoçamos e Biô foi logo dizendo que descia pra Currais Novos de carro. Valou com um parente e jogou a bike pra cima de uma Strada.

Já passavam das 4 da tarde quando saímos de Cerro Corá. Pensei logo "Agora é só na banguela da qui pros currais". Pois bem, não me lembrava que Cerro Corá ficava depois de serra. Quando saímos da cidade, tava lá a serrona pra subir. Mas mantive a calma e subi só nas manhas.

Pronto Agora é só na banguela. Era a primeira que atravessava a serra da RN042. Dizem que é mais perigosa que a estrada de Lagoa Nova.  Como meu freio era a disco mecânico comecei a descer lentamente.

Os freios já bastantes gastos tive que fazer mais força para manter a velocidade lenta. foi quanto na primeira curva senti tipo o cabo querendo romper um dos fios. Me caguei nessa hora. Fui logo parando a bicicleta e comecei a descer a ladeira empurrando enquanto via pai indo embora.

Descida da serra de Cerro Corá (RN042) sentindo Currais Novos


Caraca, nunca tinha sentido tanto medo descendo uma serra como senti dessa vez. Eu só vim subir na bicicleta na última curva que tinha um desconto gigantesco pra dentro que fizeram para as carretas da energia eólica passarem com as torres. E mesmo assim, desci lentamente me cagando de medo.Lá em baixo meu pai já tava me esperando e segundo as contas dele já faziam 10 minutos que ele tava parado.

Depois da serra, já tava mais tranquilo quando começamos a meter o aço rumo a Currais Novos, ansioso para chega e dar uma bela duma cagada que já alertava desde que saímos de São Tomé.

Chegamos em Ligação (Trevo de Cerro Corá - BR226) era umas 5 e meia da tarde. Paramos para descansar e tomar água. Nessa altura já tava morto, mas o que me motava era que o trecho era leve e o vento a favor, porém comecei a sentir a apressão do trânsito.

Começamos a meter o aço novamente e só as fileiras de carro passando a toda hora. Erma mais de 8 carros passando numa lapada só. Na ladeira do Sertão Bonito parei novamente já morto para tomar os últimos goles de água que ainda restavam.

Nessa altura, o trânsito ficava mais pesado e minha preocupação era pra passar na curva da Sussuarana, pois é onde tem a ponte e não têm acostamento no sentido que íamos, se tornando um funil para carros e bicicletas.

Quando terminamos de subir a ladeira que avisto a ponte curva lá em baixo, estava me sentindo em Natal, uma fileira interminável de veículos passando por nós até a curva. E tinha mais outra, o acostamento para descer aquela ladeira era horrível, deixando o trecho ainda mais perigoso.

O medo que senti pra descer a serra na estrada de Cerro Corá voltou a tomar conta de mim, mas consegui sobreviver a este trecho. Eram por volta das 18h e 15 minutos quando chegamos em Currais Novos e o velocímetro registrava 164km de toda essa viagem.

Essa aventura ainda rendeu muito. Acordei na terça-feira de manhã e passei o todo na maior lombra da viagem, estava com uma paz interior enorme, essa viagem foi um verdadeiro cano de escape que me deu equilíbrio mental novamente. Percebi isso quando umas coisas não estavam dando certo, mas eu tava nem aí, o mundo poderia tá se acabando, mas eu tava na lombra da viagem.

Foi uma viagem muito sofrida, porém muito divertida. Nada melhor do que sair de casa e não ter hora pra chegar. Conhecer lugares, pessoas, viver experiências que te tirem da zona de conforto. Sempre que possível estarei inventando essas rotas anormais.

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